Natureza, convivência e negócios: A treta sobre a casa do Ultra Music Festival

Coincidência, talvez, mas certamente esse momentos em que a gente está no lugar certo, na hora certa, para a produção certa. Além de um entusiasta no Ultra Music Festival, este que vos escreve acaba de voltar de alguns dias de cara com o Bayfront Park. Como todo fã, tentei entender melhor sobre a estrutura e o local onde tantos momentos épicos já aconteceram. Sem a mais remota ideia de que o evento vinha correndo o risco iminente de ficar sem casa, sem grama, sem chão. E justamente por isso a missão de entender o motivos pelos quais esse impedimento acabou se construindo fica mais simples, ainda que longa. Chega mais.

A primeira compreensão necessária é quanto a geografia da cidade de Miami. Chamemos por coração, pela parte mais intensa, dois lugares. O bairro financeiro e suas avenidas pomposas e retumbantes como a Brickell, como maior exemplo. Uma ponte depois, o centro. Downtown. Lá, o centro comercial mais antigo e tradicional de construções menos ostentadoras, mas de um varejo que há tempos foi muito mais intenso do que é hoje, apesar do apelo histórico que mantém. Adiante, na orla da baía, em Biscayne Blvd, três âncoras que trazem fluxo e relevância comercial para os imensos prédios comerciais, como Bank of America e para a rede hoteleira que se faz bastante forte com opções locais e de redes.

Quais, você me pergunta. Bora!

American Airlines Arena

O ginásio do Miami Heat, a franquia local que disputa a NBA, a liga de basquete norte americana. Importante saber que de outubro a maio, em média, há jogo na arena em pelo menos 3 datas por semana, pelo menos! Além de ser a casa dos grandes shows que acontecem na cidade, Drake e Migos em Novembro, é um caso auto explicativo. Com capacidade para até vinte e uma mil pessoas, é um endereço que está intimamente ligado com a escolha do Ultra e sua consequente desavença com o espaço.

Port of Miami/Bayside

Como se fossem três spots lado a lado, esse segundo item está entre o Park e a arena. Centro comercial competente e local de restaurantes com vista e pier para a Baía, o Bayside é hit. Todo visitante, vai. Todo local, passeia. É fonte segura de mais fluxo, mais gente, mais barulho e obviamente mais dinheiro para a cidade, como um todo. O Porto de Miami que emprega cerca de 100 mil pessoas e movimenta 12 bilhões de dólares é um monstro. Os números se explicam. Além do mais, quando se observa o mainstage do Ultra pela televisão, você nota os guindastes do porto e a área comercial do Bayside. Os espaços se confundem e entrelaçam até chegarmos ao cerne da questão.

Bayfront Park

Belíssimo. De natureza impecável, esquilos que se amontoam pelas palmeiras em busca de frutos, de anfíbios que se escondem entre a água e a vegetação, o parque foi inaugurado em 1925 e tem mais de 130 mil metros quadrados de extensão. Local da festa de réveillon de Miami, desde 1999, abriga o Ultra. Hoje, com mais palcos além do imponente mainstage, o Resistance, por exemplo, já toma mais ainda a área verde do parque. Um primeiro gotejo de tempestade que vinha sendo plantada pelos moradores que se viam em desespero pelo amontoar de eventos e fontes de tráfego na avenida. Formando a trinca do barulho que pra bem ou pra mal, agita completamente o coração luminoso de Miami.

Ontem, 27 de Setembro, em votação unânime de comissionários da cidade, ficou decidida a não renovação de contrato do UMF. Inclusive a edição de 2019, que já comercializa entradas. É um imenso baque. Não há um lugar tão abastecido de transporte (Metromover), hotéis, apartamentos, restaurantes e a beleza natural, talvez no mundo, que seja capaz de suprir o que o Bayfront representa. O evento ainda busca solução temporária para evitar uma celeuma em 2019. O problema será bem intenso.

A mim, parece uma decisão coerente, se pensando como morador, que já fui, afinal, tudo se complica. A via que liga o centro aos bairros até Miami Beach e os acessos até as auto estradas fica bloqueada, o trânsito enlouquece, complica muito a vida econômica do comércio e do porto. Tudo fica revirado ao longo de uma semana de pré, durante e pós. O efeito ambiental é enorme. A intensidade de onda sonora, como foi aqui no Brasil para a preservação animal da Quinta da Boa Vista, no RJ, afeta diretamente a sobrevivência desses animais que lá vivem. São muitos pontos congruentes que evidenciam a reclamação como algo além de birra contra barulho.

Como visitante, é uma tristeza. O Ultra fica no melhor lugar possível. Não tem como ser melhor posicionado. Fica a impressão que naturalmente haverá uma migração para o complexo do Hard Rock Stadium, o antigo Met Life, localizado a 30 minutos de carro desde o Bayfront Park. Local de excelente área de estacionamento, o estádio é gigantesco e não há vizinhança afetada. Longe e com acesso complicado, mas me parece a opção mais viável pra todo mundo.

Situação duríssima.