4 dias no Dreamville: A verdadeira experiência do Tomorrowland Brasil

Tomorrowland chegando e como TODO MUNDO fica naquela expectativa de saber como é a experiência do festival, resgatamos um artigo contando um resumo da experiência além do festival, o DreamVille. Aviso! Este artigo contém SPOILERS (risos), falando sério galera, o intuito é passar a EXPERIÊNCIA REAL do Tomorrowland Brasil, pois são 4 dias lá e todos os leitores anseiam por saber como tudo funciona, até porque também planejam ir algum dia e querem DICAS de sobrevivência, enfim, não tem nada maquiado, apenas o relato sincero, não como jornalista, e sim como aventureiro e principalmente amante da música eletrônica.

#1 A Viagem sem fim

Eu e o Vini, meu grande parceiro nessa jornada, pegamos um ônibus as 5:20 da manhã de Garopaba (cidadezinha litorânea que eu moro e amo de coração) até Floripa, onde lá nos unimos com mais outros dois amigos, Junior Ramos e Victor Ventura, até o Aeroporto Hercílio Luz com destino ao Aeroporto de Guarulhos, São Paulo. Nesse trajeto já nos enturmamos com mais uma galerinha da Ilha que iam para o Tomorrowland também, o que foi muito bom pra passar o tempo na espera do transfer de Guarulhos pra Itu, onde a fila parecia um caracol de gente, estilo joguinho da cobrinha que tinha nos celulares Nokia antigamente, quando você estava prestes a ganhar. Mas a empolgação do grupo e o nosso amigo vestido de Pikachu agitando a galera, fizeram que mais de uma hora de espera passassem num piscar de olhos.

O destaque foi para quando confundimos um grupo de asiáticas na fila achando que elas fossem japonesas e elas responderam indignadas em inglês ‘nós somos da Coréia, pô!’. Com certeza o que mais nos surpreendeu foi a quantidade de pessoas de todos os lugares do mundo num mesmo saguão: colombianos, canadenses, asiáticos, americanos, chilenos (esses tinham uma penca) e por aí vai.

Pegamos então um ônibus executivo que nos levou até o festival, que para minha surpresa é longe pra caramba de Guarulhos, e eu já não aguentava mais ficar sentado. No total, foram mais de 10 horas de jornada, não foi nem um pouco moleza, mas chegamos são e salvos!

#2 Finalmente, a chegada

Desembarcando do ônibus tivemos que andar mais ou menos 1km de estrada de chão (puta sacanagem!) com malas de rodinha e um monte de mochilas recheadas de comida até a boca, e eu esperto fui de tênis preto (não façam isso pelamor!) que ficou marrom de um jeito que parece que não tem mais como lavar.

Enfim, chegando na área do check-in da Dreamville, nos deparamos com uma fila gigantesca de pessoas pro Easy Tent (módulo de acampamento que você ganhava a barraca e colchão), pois só havia um guichê de meia-entrada (sacanagem em dose dupla!), o que rendeu mais 2 horas de espera de baixo do sol. Pelo menos eles distribuíram água pra galera não passar mal logo na entrada do evento.

Já no guichê para tirar as pulseiras do Dreamville e a pulseira Full Madness (que dava direito de entrada para todos os dias do festival) nos deparamos com os funcionários totalmente perdidos e o sistema fora do ar (mais essa pra ajudar!). Retirando as pulseiras fomos pra entrada do acampamento, onde adivinha só: também tinha fila pra revista. Agora eu dou risada, mas lá na hora minha paciência já tava quase no limite.

Aí foi quando eu me dei conta do porque tudo estava tão desorganizado: serviço terceirizado. E faz até sentido, pois não tem como a organização trazer 7000 funcionários importados da Bélgica, o que os deixou de mãos atadas nesse quesito, que infelizmente deixou MUITO a desejar.

#3 ‘É um prazer poder te ajudar’

Frase estampada na camiseta dos funcionários do Tomorrowland, chamados de ‘The Crew’, que parecia ser mais slogan institucional do que a realidade. A maioria dos funcionários não tinham noção alguma de inglês para poder informar os gringos, e pior que algumas informações como transfer, por exemplo, a maioria deles não sabiam informar, o que deixou muita gente confusa. A revista das malas na entrada também foi fraca (devido ao atraso), onde muita gente entrou com garrafas de bebida entre outras coisas que não eram permitidas.

#4 Bem-vindo a Dreamville!

Foto do distrito Regular Camping onde cada um levava a sua barraca

Depois de tantos guichês, revistas e todo caminho percorrido no sol quente, me deparei com um jornalzinho local, que contava todos os detalhes das atrações do The Gathering (festa de boas vindas exclusiva para os hóspedes do acampamento) onde era escrito em inglês e português, com bastante infos e coisas interessantes (ponto pro festival!). E esse jornal foi entregue gratuitamente todo dia de manhã durante os 4 dias, com fotos do evento e até dos Dreamvillers, tornando-se um ótimo substituto dos smartphones.

Falando neles, sinal e tomada pra carregar o celular eram disputadíssimos nos distritos Regular Camp e Easy Tent, onde os únicos pontos de energia encontravam-se nos banheiros ou em uns postes a céu aberto, o que obrigou a galera a improvisar uma quantidade inimaginável de ‘T’s e extensões de energia (não sei como não pegou fogo!). Como disse meu amigo Junior Ramos: “Em terra de Tomorrowland, quem tem T, tem preferência!”.

Teve até um fato curioso que aconteceu comigo: levei um rabicho quente (uma mini resistência tipo de chuveiro feito pra aquecer a água na garrafa térmica) pra fazer Cup Noodles (macarrão no potinho) quando do nada chegou um funcionário e sem mais nem menos arrancou da tomada com força, tirando os ‘T’s do pessoal que estava carregando os celulares, gerando tumulto, pois o mesmo disse que não podia usar esse tipo de equipamento já que poderia dar curto circuito. Pra minha sorte, a galera toda comprou a briga, e até tinha um rapaz que era engenheiro elétrico que me defendeu e disse que o problema não era o meu rabicho e sim o descaso de não ter tomadas suficientes nem pra 10% do público, obrigando todos a fazer aquela gambiarra toda.

No fim das contas eu saí fora dali, mas fiquei sabendo mais tarde por outro funcionário que disse que esse segurança estava ‘mal intencionado’ e que ele queria pegar o rabicho quente pra ele. Sem comentários né.

#5 Política da boa vizinhança

Querendo ou não, independente de que país você vinha, sua cor, classe social, ou qualquer outro fator de segregação, foi deixado de lado, pois todos estavam na mesma situação, tornando a convivência muito mais colaborativa. Fizemos amizade com quase todos os nossos vizinhos, que por coincidência eram praticamente todos brasileiros. A troca de experiências se tornou um dos principais atributos do festival.

#6 As barracas Easy Tent

Chegando no distrito Easy Tent, um orientador pegava seu número de barraca e te levava até ela. O interessante é que eram divididas em mini-ruas com plaquinhas de nomes de grandes cidades dos países do mundo todo, inclusive do Brasil, aliás a minha rua era São Paulo e a barraca era a de número 0543.

Dentro da barraca tinha um saco de dormir para cada um, que era tão bom que nem precisou de coberta. Tinha um travesseirinho, um colchão inflável, um espelho de mão, uma lamparina de teto da barraca que recarregava com energia solar e um cadeado de senha (testei ele e estragou rapidinho, recomendo levar um cadeado próprio, custa entre R$10 e R$15 em qualquer instaladora). Mas o legal é que veio tudo prontinho pro uso, era só se jogar!

Outro detalhe, acordar cedo todo dia não era uma tarefa difícil, já que o sol batendo na barraca funcionava que nem um despertador natural: ou você abria, ou torrava dentro dela (risos). Logo a galera já adaptou de colocar os sacos de dormir em cima dela, que encaixava tipo chapelzinho vermelho, assim aliviava o calor dentro da barraca (fica a dica!).

O único contra da barraca era que a lona dela era muito fina, sendo que a noite a umidade entrava, então na hora de levantar tinha que ter cuidado pra não bater nas laterais e tomar um banho d’água!

#8 E na hora do banho, como fica?

Lembra o que eu falei das filas? Então, eu acordei às 8h da manhã pra ir tomar minha ducha achando que justamente por ser cedo ninguém ia ir, mas por incrível que pareça, quase todo mundo teve a mesma ideia (risos!). O esquema é sempre pensar na lógica contrária que tá tudo certo!

O banheiro compartilhado (tipo aqueles de time de futebol americano) custa 3 Tokens o banho (R$16,65) e você tem 4 minutos de uso, ou seja, agilidade nessa hora era tudo! Mas fica tranquilo que você pode parar o contador/água, pra poder se ensaboar com calma. A minha dica é você se trocar dentro do box mesmo pra ter mais privacidade, coloca a toalha por cima do cano do chuveiro (essa dica veio dos guris!) dobrada pra não molhar, o shampoo/condicionador e sabonete no cantinho, pra ficar tudo mais prático.

#9 The Gathering

Quinta-feira, rolou uma festa exclusiva apenas para os ‘hóspedes’ do DreamVille, chamada The Gathering, em um palco com uma cabeça em formato de sol (me lembrou o solzinho do Teletubbies versão psicodélica do mal, risos!), e que contou com uma pequena prévia do som que ia rolar no festival, tendo bastante Big Room e as famosas que todo mundo canta, até o Drum N’ Bass com DJ Marky e o Trap com DJ Zegon, teve também uma pitada de Hard Style com o DJ Coone. Este palco foi usado apenas pra esse dia, mostrando a capacidade de sobra da estrutura que o festival fornecia.

#10 O festival

Na sexta-feira 14h chegava a hora mais esperada de todas, e lá estávamos nós na entrada do festival, no meio de uma multidão enlouquecidamente animada e ansiosa para entrar, e não tinha como não se contagiar com aquele vibe toda. Se pudéssemos resumir o festival em uma frase seria: “Êeeeeee!… Ôoooooo!….Êeeeeee…” toda hora, todo dia, a qualquer momento alguém puxava o coro e a galera ia na onda… Então, imagina na porta do festival.

Entrando finalmente no Tomorrowland, nos deparamos com uma estrutura gigantesca: O mainstage. O palco principal era tão grande (em altura e largura) que assistíamos o show a quase 1 km de distância sem problema algum, pois a medida que se afastava do palco ia subindo um morro que parecia uma sala de cinema, ou melhor, um coliseu da música eletrônica.

Os efeitos nem se fala, tinha tocha de fogo que você sentia o calor de longe, lasers e luzes pra todos os lados, canhões de fogos coloridos sincronizados, artistas circenses fazendo acrobacias, chafarizes dançando na sincronia da música, e o livro gigante, que ao anoitecer abria pra anunciar os artistas principais, onde aparecia o rosto de uma mulher contando uma história cinemática a cada intervalo, levando o público ao delírio.

Uma coisa que me impressionou foi a quantidade incontável de smartphones e câmeras, e também com o famoso bastão de selfie, registrando cada momento importante. No final de cada noite, o show pirotécnico era de encher os olhos! Eu nunca vi estrutura tão grande no Brasil. Sente só essa foto pra ter noção da dimensão da coisa:

Visão aérea do festival no Parque Maeda

Créditos: Folha de São Paulo.

Esse mapa resumia a dimensão do festival, que era humanamente impossível de você aproveitar tudo o que ele te proporcionava, por isso você tinha que criar seu próprio line de artistas favoritos pra ver, e caminhar feito um camelo de um lado para outro sem parar de dançar (risos!). Entre os 7 palcos tematizados, você tinha como opção: o Mainstage; Flowers Stage: em formato de uma flor gigante; Grand Theatre: palco pequeno no meio de um jardim cheio de bolhinhas de sabão voando pelo ar, altas vibe; Mushroom Stage: palco coberto e escuro com vários cogumelos gigantes suspensos no ar, bem psicodélico; Frame Stage: palco com vários espelhos gigantes, meu favorito; Open Stage: palco ao ar livre numa vibe bem deserto; e por fim o Oriental Stage: palco com um castelo asiático enorme; Vou resumir então os pontos altos dos palcos que eu fui e os artistas que me chamaram atenção.

Na sexta-feira eu fui para Frame Stage no dia do SUPER YOU & ME (palco do Laidback Luke) quem me surpreendeu foi a dupla GTA, que além de ÓTIMOS djs, as produções deles eram sensacionais, destacando a sequência de Jungle Terror e uns sons com batidas rápidas e os Trap pra quebrar a velocidade no meio, não deixando ninguém parar de dançar nem por um minuto. Pra lacrar a sequência eles encerraram com o seu hit do momento ‘Intoxicated‘ em parceria com o Martin Solveig.

No sábado eu fui ao Oriental Stage, no dia da DIM MAK (palco do Steve Aoki) onde o meu artista favorito foi o Borgore, que começou o set com as clássicas do Dubstep, passando pro Trap, Jungle Terror, Moombahton e até “Avril Lavigne – Complicated” (ele deixou a música toda e a galera entrou na onda da zueira do cara e cantou até o fim) fechando o set com chave de ouro com “Decisions”, sua parceria famosa com a Miley Cyrus (que há quem diga que foi ele que deu um empurrãozinho na despirocada da garota), onde ele cantou a música toda terminando só na acapella… E a galera? Foi ao delírio!

Já no domingo fomos primeiramente a tarde ao mainstage assistir a dupla Tropkillaz, que convidou o Mc Cachorro Magro pra “narrar” o show deles (o cara manda bem) e tocaram os clássicos como “Baby Baby”, “Turn Down For What” (do DJ Snake), uma série de pancadas de Jungle Terror, até o Hip Hop mais clássico como “Jump Around” do House Of Pain.

Outro produtor brasileiro que levou uma multidão tanto de brasileiros como gringos pro Frame Stage no terceiro dia de festival (palco Smash The House do Dimitri Vegas & Like Mike) foi o Vintage Culture, abrindo com o seu remix de “Faded” do ZHU e botando a galera pra dançar com um set único que faz jus ao nome “vintage”, pois resgata muitos elementos antigos numa nova roupagem que é marca registrada do artista. Quem não viu o show desse cara, vale a pena conferir!

Minha menção honrosa vai pro set do mestre OMULU, carioca fundador da nova onda da rasteirinha com a música eletrônica, e também na influência de gêneros brazucas (quem quiser saber mais podem ler meu artigo sobre o cara) que infelizmente eu não tive como ficar lá para assisti-lo por causa do meu transfer que saiu mais cedo, mas meus amigos Junior e Victor disseram que o show dele foi sensacional. O cara teve a audácia de tocar funk no Tomorrowland e ver a galera descer até o chão no palco Open Stage (da BUUUM TRAX vs Ganza do Tropkillaz), tapa na cara dos elitistas de plantão e e isso é só uma amostra do que está por vir.

E pra me matar do coração, o cara ainda tocou meu remix dance hall da música “Who” do Tujamo e falou meu nome no microfone, que foi citado como um dos pontos altos do show dele que a galera mais curtiu, e eu quase morri no aeroporto whatsapp. Muito obrigado mestre! Dá pra ouvir o set do OMULU e baixar:

Extra: Histórias que povo conta

Quem viveu os 4 dias no DreamVille não teve como não ouvir a curiosa história do desaparecimento da Carol, que quem me contou foi o meu amigo Victor, mais ou menos assim: Quinta-feira na festa do The Gathering teve um cara que ficou com essa tal de Carol e se apaixonou por ela, e ela disse que ia no bar ou no banheiro e disse que já voltava, e o cara ficou esperando, mas ela nunca mais voltou. Aí esse cara na sexta-feira foi à procura dela e teve a ideia de fazer uma plaquinha escrita “Procura-se Carol, Recompensa: Meio Token” algo assim… Já no domingo, ele apareceu várias vezes no telão, que foi quando explodiu que todo mundo começou a procurar ela e gritar “Ôhh Carol!!!” e logo espalhou pelo DreamVille todo, tanto que foi um trabalho pra dormir (risos!).

Este foi o primeiro dos 4 distritos do Regular Camp, então já da pra imaginar o porque foi difícil achar a Carol

Considerações finais

Apesar de o serviço ter deixado (e muito) a desejar, a experiência de acampar 3 dias e ver gente de todos os lugares do mundo em busca de música eletrônica é de lavar a alma. Como meu amigo Ale Abate disse: “Tomorrowland com a cara do Brasil: Festa, insanidade e o pior serviço do mundo”.

Na hora de ir embora conheci um americano de Chicago, muito simpático e que já foi no TomorrowWorld e o Tomorrowland oficial na Bélgica. Ele também estava meio perdido quanto ao transfer (ninguém sabia informar nada, muito menos explicar isso em inglês) que deixou um breve depoimento sobre sua experiência do festival: ‘O Tomorrowland no Brasil foi insano! Gostei muito do festival. Pena que tudo era muito desorganizado em comparação a Bélgica, mas o público era muito animado e fez tudo valer a pena!’. Mas como todos estão comentando, apesar dos defeitos, os vindos de um festival dessa magnitude mudou a história da música eletrônica no nosso país, e eu fico realmente grato com essa evolução que eles influenciaram no mercado brasileiro. Haters gonna hate mas agora, o jogo mudou!

Agradecimentos finais para todos os envolvidos: Vini, meu grande parceiro de jornada; Ao Victor e o Junior meus vizinhos de barraca, companhia fiel e salvadores das horas difíceis; A todos os amigos do grupo do Whats “Tomorrowlanders” e todos que contribuíram comigo em todos os momentos que estive por lá. A todos meu muito obrigado!

*Este artigo foi originalmente escrito por Johny Marcon em maio de 2015.